terça-feira, 11 de outubro de 2011

Francisco Paco Souza

Atuação: A responsabilidade de um reprodutor de ideologias
Francisco Paco Souza – paco.souza@live.com / UFSCar

Temos no teatro atual uma dificuldade na definição de suas formas. Vemos peças sendo apresentadas a esmo, com atores muitas vezes despreparados, sem conhecer a fundo a peça apresentada. Vemos também peças apresentadas para um público leigo e alienado, que só se importa se no elenco da peça haverá algum ator televisivo.
O teatro na contemporaneidade mudou, o público que vai ao teatro mudou. Com o surgimento das novas mídias (TV, internet) e a sofisticação do cinema, são poucos os que se locomovem até um teatro para assistir a uma peça.
O teatro tem essa singularidade perante as outras formas de arte, pois necessita que ambos, atores e plateia, se locomovam para aquele determinado local de encenação naquela determinada hora. Não há distribuição em massa quando se fala em teatro, diferente do cinema, por exemplo, em que num dia de estreia há milhares de pessoas em todo o mundo assistindo.O teatro é mais reduzido, só quem está lá naquele momento pode assisti-lo (uma vez que, se gravado, o gênero irá mudar e a obra estética em questão não mais pertencerá ao gênero teatro).
Sendo assim, cada apresentação é única, as formas como os atores irão falar, andar, os erros cometidos ou os momentos de improvisação serão únicos.
Todos estes fatos trazem para o ator uma grande responsabilidade. Figueiredo (2010, pg. 15, 16), fala em seu texto sobre as diferenças cruciais entre ato e ação: “A ação é caracterizada como uma atitude mecânica ou  impensada,  ou  seja,  na  ação  não    o comportamento  responsivo  do  sujeito  que  age  como  um  mero  reprodutor  das  ideologias dominantes  e  não  se  responsabiliza  por  suas  ações  e  pensamentos,  diferentemente  do  que acontece no ato, no qual o sujeito assume a responsabilidade pelo seu pensar perante o outro; é a assinatura responsiva de cada sujeito, única e singular na existência”.
Quando está atuando, o ator está reproduzindo um texto, encenando uma peça teatral de um determinado autor. O ator é levado, através das falas de sua personagem e da situacionalidade da obra, a atuar de uma determinada forma. Vendo deste ponto de vista, ele está reproduzindo ideologias, que não são necessariamente oficiais. Estas ideologias reproduzidas pelos atores podem muito bem ser do cotidiano, porém mesmo assim o ator está, a certo ponto, reproduzindo-as. Poder-se-ia tomar apenas este ponto de vista para analisar uma obra teatral, olhando o ator apenas como um reprodutor de ideologias, porém, tratando-se de uma obra teatral, onde aquele ator encenará uma determinada peça, de um determinado modo apenas uma vez, faz-se necessário responsabiliza-lo pelo que está sendo dito. Em um filme de cinema, onde muitas das cenas são regravadas várias vezes, até chegar a “perfeição” do ponto de vista do diretor, o mesmo pode dar vários palpites, e se ele não gostou de uma cena, ele a muda ao seu desejo. Já em uma peça de teatro, por mais que haja diversos ensaios antes da apresentação, com vários palpites do diretor, é o ator que escolhe se realmente dirá uma fala da forma que o diretor pediu, ele pode simplesmente decidir mudar a entonação, os gestos, ou a própria fala. E é aí que a responsabilidade do ato é atribuída ao ator.
Uma peça é composta de atuações, ou melhor, de atos e ações, pois, ao mesmo tempo em que está reproduzindo ideologias, dando vida ao herói, o ator esta ressignificando a obra e é responsável por todos os enunciados por ele produzidos.
É esta ressignificação, revaloração, que mantém vivas as obras teatrais, um sujeito que vai assistir a uma peça teatral em que há uma consciência por parte dosatores da responsabilidade enquanto reprodutor de ideologias, enquanto corpo físico e estético em cena, poderá ir várias vezes assistir a uma mesma peça e vê-la de vários modos diferentes, temos aqui um acabamento não acabado.
Cada enunciado é um elo na cadeia dos atos de fala, então, não deixem que essa corrente se rompa, ou seja... se a vida é palco somos todos atores e o corpo por si só imóvel fala...e então como se calar diante disso?

Bibliografia:            
Figueiredo, Marina Haber de. Erotismo e contemplação em “Infância”, de Manoel de Barros.  São Carlos : UFSCar, 2011

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