segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Marcela Lamoréa

A contemplação responsiva no teatro contemporâneo.
Marcela Lamoréa – Bacharel em Lingüística (Graduação)
UFSCAR - Universidade Federal de São Carlos

            Pensar teatro contemporâneo é muitas vezes se ater a termos que vem oficializar, conceitos definidores, bem como o pós-modernismo e o papel\função do dramaturgista. Colocar em pauta essa questão polemica que superficialmente relaciona-se com nomenclaturas, contribuem para formação de valores e ideologias vinculada a um movimento artístico possivelmente diferenciado. E é neste envolto lingüístico que aprofundo minha visão, por uma ótica bakhtiniana, para discutir e alargar a concepção da linguagem abordada nos palcos da atualidade.  
            O ato responsivo é a obrigação subentendida nascida em cada discurso proferido entre um sujeito que fala com outro sujeito que fala, a necessidade de manter o curso desta relação induz uma cadeia de respostas, e a dialógica desses sujeitos é um ato de responsabilidade, trazendo a questão ética dos conceitos bakhtinianos. Portanto uma “simples e singular” resposta é carregada de atos responsáveis anteriores e futuros. A contemplação é medida pelo conjunto de valores que permeiam a estética, não só abordada pelos conceitos filosóficos (o belo em si), mas também fazendo uso da noção de estética composta pela linguagem, neste caso mais especifico, dos conceitos de Bakhtin. Neste ponto temos o valor estético exercendo a função do excedente de visão, ou seja, na contemplação de uma obra cênica o olhar do outro é peça fundamental para o acabamento. E no momento transitório dos valores contemporâneos temos o excedente desta visão, movimentos artísticos anteriores, em dialogo com a materialidade atual.
            Bem como contempladores e ao mesmo tempo responsáveis pela definição do que é ou do que esta sendo o teatro contemporâneo os sujeitos destas ações esbarram em questões teóricas, a fim de fundamentar a múltipla linguagem proposta pela modernidade. 
              Ética, nos estudos Bakhtiniano, vem ligado ao ato da vida em face com a realidade, a singularidade do individuo e responsividade do agir ético. Uma vez que todo discurso é respondível, a ética torna-se parte arquitetônica (estruturação do discurso) para o acabamento da obra (ou acabamento do agir do sujeito), em conjunto com a valoração do sujeito, o conteúdo e o processo do ato, refletido na sua própria estética. Dessa forma a ética vincula-se a responsabilidade do sujeito para responder à suas decisões de maneira singular, permitida pelo espaço, tempo e leituras de mundo que apenas este o faz.
            Estética combinada com a ética constrói a ponte entre o mundo real (valorações do sujeito) e a forma arquitetada e direcionada para o acabamento. O sujeito criador de sua estica traduz para o material da obra os discursos dialógicos de seu mundo ético e intelecto (cognitivo). Porém a concepção de estética vai alem da leitura apenas artística da obra, atinge as entre linhas dos sujeitos relacionados em sua contemplação e reflete\refrata posturas exotópica em um jogo de construção de sentidos.
            Tendo como base esses dois conceitos mencionados acima, e retomando a questão relevante para a analise das nomenclaturas no espaço cênico vinculado à contemplação do mesmo, o papel do dramaturgo pós-moderno depara-se com a necessidade de experimentar novas linguagens. Dialogando com fortes marcas dos atos cênicos antecedentes: com o realismo e seus discursos aproximados da vida real e da ética, com o expressionismo manipulando a estética para ilustrar temáticas sócias, com o teatro épico e seus distanciamentos e recursos cênicos aflorados.  É neste cenário de diálogos pautado na ética e na estética cultural do fazer teatro que se instaura a pós-modernidade, no entanto a critica ao pós-modernismo traz a idéia de que esta postura é apenas uma releitura de movimentos passados, sendo irrelevante a questão de atualizações em suas nomenclaturas. Mas para os conceitos de Bakhtin, a transição ocorre em meio às interações que necessitam de algo novo para se identificar, ou seja, a leitura que se faz do teatro atual, ecoa sim da linguagem antiga, mas este se reconfigura na medida em que seu interventor se modifica, em um jogo dialógico na construção de sentidos.
            Assim a função e a atuação do dramaturgo não são mais a daquele sujeito que escreve apenas para o teatro, distanciado do ambiente cênico, alguém que constrói no mundo das idéias uma historia sem vínculos com ética e a estética do fazer cênico. E tido para esse papel uma nova postura apta a realizar de fato novas leituras. Emerge deste solo fértil da contemplação responsiva e dialógica na contemporaneidade o sujeito dramaturgista, manipulador da variedade lingüística teatral, traduzindo um pensar e  um construir diferente do dramaturgo. Esse sujeito ideologicamente novo aprofunda a contemplação do ato responsável ético e estético, pensando em um texto teatral que abarque a diversidade de manifestações exotópicas permitida pela linguagem neste meio, reunido toda a materialidade do agora conversando com discursos já vistos e com a consciência da releitura cênica, constituindo o novo e não apenas o remontado.
            Um simples olhar focado em um novo detalhe seja este a atualização de um termo funcional já existente, para os estudos bakhtinianos não é meramente simplório e descartável, traz a transição ideologia e a valoração propagada por meio dos diálogos que reúnem a responsividade do grupo social no qual está inserido. 

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