segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Lara Martins de Almeida

Cinema, educação, vivências estéticas e responsividade
Lara Martins de Almeida[1]

“O que é decisivo, estou cada vez mais convencido, não é nem mesmo o “saber” do professor sobre o cinema, é a maneira como ele se apropria de seu objeto” (BERGALA, 2008).

 Desde a infância, a arte sempre se fez presente em minha vida diretamente, na confecção das avós, nas aulas de dança, nos encontros no Espaço Arte[2], nas maratonas de filmes no fim de semana... ou indiretamente, através de amigos do BIAD[3], de colegas que atuam no teatro, de companheiros que tocam em bandas... Se a arte se faz tão presente em minha vida, não pode se afastar da minha formação acadêmica, uma vez que Ciência, Arte e Vida só adquirem unidade no indivíduo que os incorpora à sua própria unidade, caso contrário, tornam-se mecânicos, estéreis de sentido (BAKHTIN, 2010). Por isso, durante o Curso de Pedagogia, sempre procurei ligações entre educação e arte.
Os caminhos trilhados me levaram ao Grupo de Pesquisa LIC - Linguagem, Interação e Conhecimento (UFJF), coordenado pela professora Maria Teresa de Assunção Freitas. Sou integrante da pesquisa “Computador-internet e cinema como instrumentos culturais de aprendizagem na formação de professores”[4] e dentre os subprojetos que a compõem, decidi focar-me no subprojeto V:
Compreender os modos pelos quais tem sido apropriadas e estudadas as relações entre o cinema e a educação no curso de Pedagogia e Licenciaturas da UFJF, construindo com seus alunos e professores uma experiência formativa com imagens fílmicas no ambiente educativo, visando compreender como se dá a fruição dessas peças fílmicas no ambiente educativo, visando compreender como se dá a fruição dessas peças fílmicas no processo de aprendizagem.
(FREITAS, 2009)

Nesse sub-projeto  participo como co-pesquisadora desenvolvendo  atividades nos trabalhos de campo realizados. Para obter dados de pesquisa aplicamos questionários aos alunos e professores do curso de Pedagogia e Licenciaturas da UFJF buscando conhecer suas experiências e atitudes em relação ao cinema.  A apuração destes questionários, confirmou a predominância entre os pesquisados de uma utilização do cinema a partir da estética hollywoodiana .Também foi percebido   em alguns casos,  um certo desinteresse pelo cinema. Diante dessa situação foi pensado no Grupo LIC um trabalho que pudesse contribuir para a educação do olhar desses alunos em seu processo de formação inicial.  Assim, foi criado o Cineduca envolvendo uma programação com sessões de filmes seguidas de debates.
Nossa pesquisa tem como uma de suas bases teóricas Bakhtin e seu Círculo. Compreendemos que diante da linguagem cinematográfica o expectador/contemplador de forma exotópica, com seu excedente de visão, produz múltiplos sentidos que completa a obra de seu autor.
O Cineduca foi, portanto, pensado com o intuito de proporcionar aos alunos de Pedagogia e Licenciaturas uma experiência estética diferente da por eles vivenciada com o cinema.  Assim, este projeto foi constituído por 6 sessões de filmes de diferentes nacionalidades, seguidos de diálogos mediados pelo doutorando Sergio Augusto Leal de Medeiros[5]. Com os filmes “Colcha de retalhos”; “Cinema Paradiso”; “Verônica”, “Fale com ela”; Língua das mariposas” e “Bubble”, a experiência do Cineduca ampliou o olhar dos alunos  participantes para uma nova estética cinematográfica, diferentes culturas e  diferentes visões de mundo.
Com o sucesso da primeira experiência, decidimos continuar o projeto Cineduca no semestre seguinte. Desta vez, sob orientação do doutorando Cristiano Rodrigues[6] e com o nome de Cineduca.doc, os filmes deram lugar aos documentários nacionais “Jogo de Cena”; “Infinito ao meu redor”; “Lixo extraordinário”, “Ônibus 174”, “Opinião Pública” e “Santiago” proporcionando o contato de alunos e professores com este gênero ainda pouco difundido no Brasil.
A cada leitura teórica sobre cinema e educação feita no grupo de pesquisa, reforça-se a importância do Cineduca como espaço de interação com o outro, de vivência estética, de construção de conhecimento para os espectadores e pesquisadores do projeto. Alain Bergala (2008), ao formular sua “hipótese-cinema” defende que o papel da escola (ou faculdade, no nosso caso) é proporcionar o encontro com filmes, tornando-os presentes em seu contexto. Há uma condição para que o cinema seja uma boa oportunidade para a educação, e essa condição é a de que ele seja tratado como um bom objeto e, sobretudo, como arte. A escola/faculdade deve em primeiro lugar falar dos filmes como obras de arte e de cultura que são.
 O gosto pelo cinema e conseqüentemente por uma cultura de cinema se dá pelo contato com uma gama diversificada de filmes. Bergala (2008) enfatiza a importância do contato com diferentes filmes e dá ao educador um papel fundamental na constituição deste gosto que pode dar-se em quatro ordens:
1.      Possibilitar o acesso a diferentes filmes (em muitos casos, a escola é o único ambiente de contato entre o aluno e o cinema).
2.      Tornar-se passador – levar os filmes aos alunos, mas filmes que tenham um significado para o professor, filmes que o tocam, que lhe dizem algo, mesmo que estes filmes não sensibilizem os alunos, pois não podemos passar ao outro algo que não nos toca, que não significa nada para nós.
3.      Aprender a freqüentar os filmes – criar o hábito de assistir filmes por prazer, como uma experiência estética e não como uma obrigação e respeitar o tempo do aluno de internalizar o filme.
4.      Tecer laços entre os filmes – fazer relações entre filmes, entre diretores, entre movimentos artísticos... perceber que aquele filme tem um significado para  a humanidade.

A tecnologia também contribui para uma nova experiência estética com o cinema. A internet, com a acessibilidade à produção cinematográfica de todas as épocas e lugares e o DVD e sua interatividade que rompem com a linearidade do cinema analógico. Nesse sentido, o Cineduca tem cumprido seu papel por uma nova pedagogia do olhar.
Neste semestre um novo Cineduca está a caminho, coordenado pela bolsista de IC Glaucia Reis que em resposta aos achados de sua pesquisa realizada para o seu Trabalho final de Curso (TCC) e dialogando com o livro “A escola vai ao cinema” de Inês Teixeira (2008) nos levará a investigar “como o cinema enxerga a escola” através dos filmes “Entre os muros da escola”; “O jarro”; “Nenhum a menos”; “Pro dia nascer feliz”; “Quando tudo começa” e “Adeus meninos”. Professores e futuros professores que com seu olhar exotópico, procuram compreender a escola vista pelo cinema.
Participar destes projetos possui um sentido diferente para mim. Como aluna do Curso de Pedagogia, também sou sujeito da pesquisa, empresto meu olhar de contempladora apoiada por minhas vivências. Como integrante do grupo e co-pesquisadora do sub-projeto V, ofereço meu olhar exotópico de co-pesquisadora ao Grupo de Pesquisa. Uma posição singular, que somente eu, do meu lugar de contempladora/pesquisadora posso oferecer.
Novos Cineduca ainda virão, pois não se esgotaram as possibilidades do cinema-educação. A cada nova edição, novos diálogos e novas possibilidades.

Referências
BERGALA, Alain. A hipótese-cinema: pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola. Rio de Janeiro: Booklink; CINEAD-LISE-FE/UFRJ, 2008.
FREITAS, M. T. A. Computador-internet e cinema como instrumentos culturais de aprendizagem na formação de professores. 2010-2014. 57 f. Projeto de pesquisa-Grupo de pesquisa Linguagem, Interação e Conhecimento, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2010.
BAKHTIN, Mikhail. A arte e responsabilidade. In: Estética da criação verbal. São Paulo: WMF Martins fontes, 2010. 5ª Ed.
TEIXEIRA, Inês Assunção de Castro; LOPES, José de Souza Miguel. A escola vai ao cinema. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.


[1] Bolsista PROBIC/FAPEMIG no Grupo de Pesquisa LIC sob orientação da Prof. Dra. Maria Teresa de Assunção Freitas.
[2] Antigo Atelier Espaço Arte em Além Paraíba-MG, onde fazia aulas de pintura e decoupage com Wander Junqueira.
[3] Bacharelado Interdisciplinar de Artes e Design da UFJF.
[4] Pesquisa financiada pelo CNPq e FAPEMIG.
[5] Professor de história do Colégio de Aplicação João VIII - UFJF
[6] Professor da Faculdade de Comunicação - UFJF

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